Blog : Ninho de Escritores

Leitura crítica #21

Dia 23 de novembro lancei um desafio para os leitores da newsletter do Ninho: em até 60 palavras, descrever o próprio quarto, recorrendo a metáforas e imagens.

Trago aqui a participação da Alissa:

A noite as sombras criam um universo diferente. A estante em frente alonga-se além do teto como se guardasse todo o conhecimento humano, ao lado dela os objetos sobre a mesa se transformam em montanhas e vales, já o guarda roupa a esquerda abre um portal para outra dimensão e da minha cama tudo controlo, como rainha deste reino solitário.

Um parágrafo com exatas 60 palavras. Os primeiros desafios que lancei publicamente no Ninho de Escritores foram no Facebook e as pessoas tinham a missão de escrever histórias com exatas 100 palavras e um tema específico.

Difícil, né? Mas possível, como vemos aqui.

Meu primeiro comentário sobre este parágrafo diz respeito à crase (e para falar disso, veja só, usei uma crase). Crase é o resultado de uma relação de afeto entre o artigo definido feminino “a” e a preposição “a”. Eles se reconhecem um no outro e se fundem como adolescentes apaixonados.

Exemplo fácil: “entreguei flores à mãe dele”, que escrevemos assim para não escrever “entreguei flores a [preposição] a [artigo] mãe dele”.

No caso do parágrafo acima, temos locuções adverbiais pedindo por crase: à noite e à esquerda. Caso tu queira mais informações sobre isso, pode pesquisar aqui.

O desafio que originou este texto pedia o uso de imagens e metáforas, e é isso que o parágrafo nos entrega com estantes infinitas, montanhas, vales e portais mágicos.

Imagens e metáforas permitem que nossa escrita vá além do que é factual, físico, presente, mas até para elas existem limites. Neste parágrafo, encontramos um deles: a verossimilhança.

O leitor precisa acreditar que o que está no texto é possível dentro do universo da história.

Quando trazemos imagens e metáforas, convidamos o leitor a estender a compreensão tradicional dos elementos presentes em uma história, mas eles precisam respeitar as regras do universo.

Porém, quando “a estante em frente alonga-se além do teto”, fico pensando sobre como ela atravessa o teto. Mas não é isso que ela faz. É a sua sombra que se alonga pelo teto, mas nunca além dele. Quando algo vai além, ultrapassa.

Para resolver isso, precisamos olhar para o verbo (alongar) e para o advérbio que o qualifica (além). Que tal se a estante se derramar pelo teto? Quando algo derrama, se espalha por uma superfície – em geral, o chão, mas estamos falando de um quarto temperado com sonhos, então por que não se derramar pelo teto?

Esta não é a melhor ideia, é apenas uma ideia entre tantas.

Isso faz sentido para ti?

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