Blog : Ninho de Escritores

Como criar o hábito da escrita

Várias pessoas me perguntam como escrever todos os dias.

Eu normalmente respondo “senta e escreve, mas a verdade é que escrever não é um hábito fácil de criar.

(Mas que esse é o melhor conselho possível, não tenho dúvidas.)

Por dia, todos nós dispomos de 24 horas, que são divididas entre atividades produtivas (trabalho), de cuidado (cozinhar, tomar banho) e de lazer (leitura, conversa).

Para criar o hábito da escrita, é preciso reconhecer que deixaremos de fazer alguma coisa. Nem que seja deixar de fazer absolutamente nada (no caso de quem tem o privilégio da preguiça à disposição).

O primeiro passo, portanto, é observar como usamos o tempo que temos. Por exemplo, eu dedico horas ao Facebook e a jogos online (e, se eu caçar mais profundamente, posso tirar uma horinha diária de sono ou reduzir o número de seriados aos quais assisto por semana).

A seguir, é necessário assumir a decisão de escrever todos os dias. A disposição de trocar hábitos de recompensa rápida (jogos online me dão prazer instantâneo) pelo hábito da escrita é fundamental.

Escrever leva tempo; sem a clareza de intenção, fica difícil bater os prazeres instantâneos da distração.

Algo que pode ajudar é determinar um gatilho para o hábito, alguma coisa que nos lembre de cumprir essa determinação. Para Stephen King, funciona escrever antes do café da manhã. Para Dorothea Brande, acordar é o gatilho para sua escrita.

O importante é que o gatilho, de alguma forma, esteja presente em uma hora na qual poderemos escrever. Colocar um alarme dizendo “escreva” no celular é interessante, mas se ele disparar enquanto estamos em pé no ônibus lotado, ou dirigindo um carro, dificilmente será possível escrever.

Um gatilho pode ser um horário específico, um momento em que sabemos que estaremos em casa ou em algum lugar com tempo (quaisquer 11 minutinhos já servem; se não tiver 11, valem oito, cinco, dois…).

Para qualquer hábito, convém começar pequeno. Talvez alguém consiga começar já com três ou quatro horas diárias de trabalho. Eu tentei e falhei, simplesmente porque os hábitos que eu tinha antes gritaram mais alto.

Se começarmos devagar, aos poucos os outros hábitos vão se acostumando a ceder espaço e acomodando esse novo hábito – tão pequeno, tão modesto. Sem que ninguém perceba, hábitos antigos serão substituídos.

Que tal, ao invés de propormos uma hora por dia, começarmos com 11 minutos? Podemos aumentar a dose diariamente: +1 minuto por dia. Ao final do primeiro mês, teremos sessões de 39 a 42 minutos de escrita.

Fiz isso em novembro do ano passado, mas com número de palavras ao invés de tempo. Comecei com 500 palavras e fui aumentando a cota em mais cinco a cada dia. Ao final de um mês, meu compromisso era de 650 palavras diárias.

Terminado novembro, eu havia escrito 17.825 palavras. Nada mal, né?

Aliás, sobre isso, é super útil enxergar o longo prazo. Às vezes, pode parecer muito pouco escrever só 500 palavras por dia, porque isso mal enche duas páginas de um livro. Porém, se eu sei que, ao final de um mês, terei quase 18 mil palavras, o processo pode ficar mais fácil.

Outra coisa que pode ajudar na formação de um hábito é tornar público o compromisso, pedindo que amigos nos cobrem sobre o nosso avanço. Pode parecer chato, mas é exatamente esse o objetivo: somos seres sociais e não queremos desapontar nossos amiguinhos.

Se estivermos assumindo por conta própria esse compromisso, sem ninguém para nos cobrar, as chances (e consequências) de desistir serão pequenas.

Além de tornar público, também é possível formar um grupo de apoio. Nesse ponto sou completamente culpado, já que essa é uma das vantagens de se participar do Ninho de Escritores: saber que há outras pessoas tentando e que elas se encontrarão para discutir os avanços de cada um ajuda no processo da formação de hábito.

Outra ideia muito útil é reduzir as limitações. Quer escrever? Não precisa ser no computador, no silêncio das montanhas ou só durante tempestades tropicais. Escreva no computador, no caderno, no guardanapo do restaurante, no celular (há aplicativos ótimos para escritores), onde quer que seja.

Muitas vezes, me pego inventando condições para que eu possa escrever, quando a verdade é que é possível escrever em qualquer lugar e momento. Ter as condições ideais para escrever seria, como a palavra sugere, o ideal, mas estamos falando sobre a dificuldade de criar hábitos, o que já sugere que não será fácil.

E uma coisa é certa: feito é melhor que perfeito.

Como consequência direta dessa última dica, podemos limitar as distrações. O fato de poder escrever em qualquer lugar e horário não quer dizer que eu não posso fechar o Facebook, desativar a internet do celular e, quem sabe, me trancar no quarto. Ou sentar embaixo de uma árvore usando fones de ouvido (desligados ou não) enquanto rabisco minhas ideias.



Deixe uma resposta

Inscreva-se: email