Sempre começo os processos do Ninho de Escritores investigando quem são os participantes e quais os desafios que eles enfrentam para escrever. Faço isso porque considero essencial saber quem escreve.
Lembro do primeiro professor de escrita que tive, lá no curso de Jornalismo. Ele não sabia o nome dos alunos, mas era bastante rápido na hora de tecer suas críticas. E aleatório ao definir as notas de cada um (mas quem reclamasse poderia aumentar a nota na mesma hora – um aprendizado interessante para o curso de Jornalismo, confesso). Ou seja, o autor do texto, para aquele professor, era irrelevante.
Eu discordo dele: sabendo quem escreve, podemos olhar com mais cuidado sobre os textos que forem produzidos.
Até ouço as vozes da discórdia: “o texto deve ser bom por si só”.
Acho, sim, que um texto deve ser bom sem depender de quem escreve. Porém, o Ninho de Escritores não é um curso para formar bons textos e sim para formar bons escritores. Há uma diferença sutil.
Como produto final do curso e dos projetos do Ninho, espero pessoas confiantes em sua capacidade de escrever e envolvidas o suficiente na escrita a ponto de conseguirem produzir. Melhorar o texto vem depois (mas, curiosamente, acontece junto – já o contrário, sei por experiência que não).
Para muita gente, o Ninho de Escritores seria inútil. São pessoas que já estão seguras do que produzem, que acreditam não ter nada a ganhar com a troca de experiências, que querem se profissionalizar. E tudo bem.
É essencial termos clareza do que serve para nós e do que não serve.
Nesse processo de buscar clareza sobre o que fazemos e queremos, pergunto a todos sobre as dificuldades da escrita. Em geral, o julgamento (pessoal e dos outros) é o principal vilão que se coloca entre nós e a criação literária.
“Esse texto não está bom.”
“Eu não sei escrever direito.”
“Não tenho domínio das regras gramaticais.”
“Meu professor ria de mim quando eu falava que queria escrever.”
“A professora disse que, depois de seis meses, eu ainda não sabia usar vírgulas.”
Muitos são os exemplos que encontramos em nossas histórias pessoais sobre pessoas que se colocaram na posição de críticas do nosso trabalho. Pode ser a mãe que diz que escrevemos coisas tristes demais, a colega de escola que fica indignada quando falamos em escrever sobre demônios, ou o namorado que sugere que escrever é perda de tempo.
Essas ideias são nocivas e agem como vírus, se instalando lá no fundo de nossos pensamentos. A escrita funciona como um gatilho, que dispara essas ideias de volta ao nosso cérebro. Sem aviso, largamos o texto para fazer qualquer outra coisa, afinal, “não sou bom com vírgulas mesmo…”.
O mais cretino disso tudo é que, muitas vezes, assumimos a culpa por essas ideias, mas elas não são nossas. Elas foram plantadas em nossos pensamentos por outras pessoas – não importa se de propósito ou não.
O primeiro passo para escaparmos desses vírus é reconhecer essas dificuldades, essas ideias nocivas que nos atrapalham. No Ninho, optamos por fazer uma escrita livre de dez minutos (mas poderia ser mais) a partir da frase: quando escrevo, tenho medo de…
A partir desse ponto, passamos a enxergar algumas das questões que se interpõem entre nós e nossa produção artística. Descobertas essas ideias, fica mais fácil enfrentá-las e reconhecer que são, na verdade, coisas que não precisamos em nossas vidas.
Por exemplo: para escrever, eu achava que precisava ser um García Marquez.