Blog : Ninho de Escritores

Leitura crítica #9

Dia 19 de outubro, propus um desafio aos leitores da newsletter do Ninho de Escritores: escrever um parágrafo de até 60 palavras narrando em terceira pessoa uma cena em que um personagem se emociona.

A Laís Helena compartilhou o seguinte parágrafo:

Suas mãos trêmulas afastaram a cortina e ela observou o monumento que lançava sombras sobre a rua, grandioso. Lembranças antigas se avivaram em sua mente, e um nó doloroso se formou em sua garganta. Percorrera um caminho doloroso desde que fora arrancada de seu mundo, mas estava de volta. E pronta para tomar aquilo que lhe pertencia.

Alguns parágrafos são desafiadores para fazer esta leitura crítica. Neste caso, vejo poucos pontos que precisam de cuidado. Há duas explicações possíveis, e quando escrevemos, nossa escolha por uma ou por outra diz bastante a respeito de como tratamos nosso ego.

Olhando o parágrafo da Laís, posso acreditar que está muito bom, e isso sugere que meu ego está bem alimentado e forte para enfrentar o mundo. Isso é positivo na maior parte do tempo, menos quando nos cega para as complicações do nosso próprio material.

Por outro lado, podemos acreditar que não somos bons o bastante porque não percebemos problemas. Neste caso, nosso frágil ego não crê que possamos haver criado um material bom.

Como de costume, nem tanto o céu, nem tanto o inferno.

O primeiro ponto que me chamou atenção neste texto foi o “grandioso”. Ele parece fora de lugar, um anexo inadequado à frase direta e leve que o antecede. Que diferença faz se o monumento era grandioso? E se faz diferença, por que não ganhar uma frase própria, maior do que apenas uma palavra?

Algumas frases adiante, temos a repetição de “doloroso”, uma frase após a outra. Comentei em outros textos: com apenas 60 palavras, não há razão para repetirmos termos que não sejam essenciais. O site Sinonimos.com.br oferece uma lista de alternativas a este adjetivo.

Para finalizar, há expressões que merecem mais detalhamento: “lembranças antigas”, “seu mundo” e “aquilo que lhe pertencia”. Lembranças do quê? Que mundo era esse? Um mundo mágico, metafísico, fantasioso, ou seria apenas uma metáfora para um estilo de vida que foi deixado de lado? O que era aquilo que lhe pertencia?

Talvez a intenção da Laís seja a de causar mistério. É algo totalmente possível e quase impossível de definir se funcionará, uma vez que estamos lendo apenas 60 palavras de uma história maior. Contudo, cabe ficar atento para que só lancemos mistérios intencionais.

Afinal, se colocarmos no texto mistérios imprevistos, a probabilidade é que não os resolvamos – e aí, além de perdido, o leitor ficará chateado e pronto para nos abandonar.

:)

Espero que estas sugestões que ofereci ao texto da Laís Helena possam te ajudar na escrita das tuas próprias histórias. Os comentários feitos neste texto não têm a intenção de serem exaustivos, mas sim de destacar algumas das questões que podem ser melhoradas.

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